Defesa agropecuária aponta os riscos da influenza aviária em Bastos
Em palestra para avicultores, Fernando Buchala alertou que a entrada do vírus no município poderia dizimar o plantel local.
Fernando Buchala:"estamos em estado de alerta sanitário" |
O coordenador da Defesa Agropecuára do Estado de São Paulo, Fernando Buchala, foi o palestrante do Seminário de Atualização sobre Influenza Aviária, realizado em Bastos, no dia 22 de maio, quando foi anunciado que São Paulo está em alerta sanitário. O evento foi realizado pela Coordenadoria de Defesa Agropecuária, a Codeagro, órgão da Secretaria de Agricultura do Estado, em conjunto com a Federação da Agricultura, a Faesp, e a Associação Paulista de Avicultura, a APA. (Leia a reportagem com o Secretário da Agricultura, Reinaldo Jardim, em Bastos: Em Bastos, secretário da Agricultura alerta para a influenza aviária)
Logo no início de sua fala dirigida aos cerca de 200 avicultores, técnicos avícolas e membros da comunidade bastense que compareceram ao evento, Fernando Buchala anunciou que diante do grave surto de Influenza Aviária (IA) em curso nos Estados Unidos, estão sendo realizadas várias ações coordenadas no Estado para mitigar os riscos da introdução do vírus da influenza aviária no Brasil. Ele lembra que a IA é uma doença exótica no país, ou seja, nunca houve relatos de sua incidência em aves brasileiras e, por isso mesmo, se entrar no país, as consequências poderão ser catastróficas. Como se trata de uma doença que pode evoluir para zoonose, obrigatoriamente levaria à dizimação dos plantéis afetados.
Por ser assim de consequências tão drásticas, há muito tempo a enfermidade é uma preocupação no país. “Temos um plano de prevenção de influenza que, na verdade, não é nenhuma novidade, pois ele congrega todas as ações que já estão definidas no Plano de Contigência para Influenza Aviária e New Castle, criado pelo Ministério da Agricultura e Abastecimento em abril de 2013” (acesse o link em Plano-de-contingencia/Plano-de-Contingencia-Versao-1_4.pdf), explicou Buchala.
Para o chefe da Defesa Agroecuária, o mais importante no momento é que os produtores e todo o corpo técnico que atende as granjas brasileiras, seja de postura comercial ou frango de corte, tenham clareza que estamos em estado de alerta sanitário, diante do risco do vírus da IA migrar dos Estados Unidos para o Brasil. “Este é o momento anterior à ocorrência da doença, quando podemos evitá-la, desde que façamos as ações corretas. É agora a hora de tomar atitudes para manter-se livre da enfermidade”.
Ele explica que foi ativado o grupo estadual de atendimento às enfermidades emergenciais, que já se reuniu e está trabalhando para estabelecer novos protocolos de atendimento a possíveis notificações de focos. Estão sendo adquiridos novos materiais de atendimento emergenciais para ter os equipamentos disponíveis aos médicos veterinários em caso de necessidade, e serão feitos novos treinamento para seu uso.
“O Governo de São Paulo não está fazendo nada de novo, pois o programa de Sanidade Avícola vem sendo executado desde 1995. Desde os primórdios do programa, o Governo de São Paulo está atento, pois temos riscos reais. É pelos aeroportos internacionais paulistas que entra e sai todo o material genético do plantel brasileiro”, lembrou Buchala, salientando que, por exemplo, o maior foco de Influenza Aviária hoje nos Estados Unidos está no estado americano de Iwoa, onde estão várias estruturas de produção de material genético da Hy-Line International.”
Buchala relatou que em 2008 o Brasil comprovou para o mundo que nunca tivemos influenza aviária e que a New Castle não existe no país desde 2003, quando foi considerada erradicada. “Foi assim que o mercado brasileiro abriu-se para o mundo. Eles precisavam de selo de garantia de que essas duas doenças não existiam em nossos planteis. Precisamos nos manter assim, e a base para isso é a manutenção do programa de biosseguridade, que é uma ação contínua, que precisa funcionar como uma corrente formada por elos de ações e medidas tomadas por todas as granjas. Precisamos que as medidas de biosseguridade e controle sejam tomadas o tempo todo. É isso que forma a prevenção permanente”.
Plateia de avicultores e técnicos da região de Bastos assiste à palestra de Fernando Buchala |
Sobre o conceito de biosseguridade, ele lembrou que Bastos conhece isso muito bem desde a ocorrência da laringotraqueíte infecciosa (LTI), em 2003. “Aquele episódio de desafio sanitário trouxe um valor agregado para Bastos, pois houve todo um investimento em biosseguridade e adesão a novas práticas, um aprendizado que não se perde”. Aquelas práticas na época da LTI, em Bastos, valem para todo o elenco da agentes etiológicos que provocam doença ou que causam diminuição da produtividade, inclusive a IA. “Nós temos que estar sempre alertas para não entrar numa zona de conforto e achar que, como não tem a doença no Brasil, ela não vai entrar nos aviários e que podemos relaxar com as práticas de biosseguridade”, alertou, estimulando a todos para revitalizar os ensinamentos que a ocorrência de laringo levou ao Bolsão de Bastos.
Quanto à biosseguridade, Buchala disse que não é preciso inventar nada: “Já existem normativas, tanto para granjas de corte, quanto postura. Basta implantar as instruções normativas 56, 59, 36 e 10. Será nos detalhes da aplicação dessas normativas no dia a dia da granja que faremos a diferença e manteremos nossos plantéis livres de doenças”. Inclusive, ele alertou que “num futuro muito próximo teremos condições de fazer bloqueios e algumas restrições para as granjas que não têm os requisitos sanitários para conseguir o GTA, o Guia de Trânsito Animal de Aves e Ovos Férteis. Estamos fazendo nossa parte e é importante que o produtor faça a sua”.
Sobre a parte que cabe ao produtor, uma das mais importantes e vitais para o sucesso do plano de prevenção da Defesa Sanitária é a imediata notificação de qualquer suspeita de doença exótica, como a Influenza Aviária, ou o retorno de doenças já erradicadas, como New Castle. “Temos uma legislação que obriga todos os produtores rurais que têm animais e seus técnicos a notificarem doenças que estão listadas nas normativas.”
Buchala explicou aos presentes que essas duas doenças – new castle e influenza aviária – podem se confundir, pois suas sintomatologias se parecem. Só com exames laboratoriais se pode determinar o que é IA e o que é NC. “As duas têm impactos negativos muito grandes e praticamente iguais, porém a influenza é ainda mais perigosa para a granja devido ao seu componente zoonótico, ou seja também pode acometer os seres humanos, o que cria um risco e uma comoção pública muito grandes”, disse Buchala, explicando que é por isso que todo o plantel acometido pela doença precisa ser dizimado imediatamente após a confirmação do vírus, assim como os plantéis num raio de 10 km ao redor. E, como o município de Bastos tem um território pequeno e muitas granjas próximas umas das outras e com alta concentração de poedeiras, a IA teria um impacto econômico extraordinário, pois poderia levar praticamente ao extermínio de todo o plantel bastense.
“Isso significa que de um dia para o outro, Bastos, que é o maior produtor brasileiro de ovos e um exportador do produto para outros estados, passaria a ter que comprar ovos para seu consumo, pois a dizimação do plantel local seria inevitável. Como não temos vacinas ou outras ferramentas para controle, a única solução é a erradicação do plantel, com o abate de todas as aves que estão no foco.”
Preocupação do Sindicato Rural
Líderes de Bastos com Arnaldo Jardim e Fernando Buchala: Sindicato Rural liderou promoção do seminário em Bastos |
Foi o secretário executivo do Sindicato Rural de Bastos, Yasuhiko Yamanaka, que, ao participar de uma reunião da Câmara Setorial de Ovos, solicitou que o Seminário de Prevenção da Influenza fosse organizado em Bastos pela Coordenadoria de Defesa Agropecuária, a Codeagro. O pedido foi reforçado também pelo avicultor Carlos Ikeda, também da diretoria do Sindicato Rural, quando esteve em Campinas (SP) participando de uma reunião com autoridades em sanidade avícola.
“Yamanaka e Carlos Ikeda perceberam o alto risco que Bastos e sua microrregião correm e nos pediu esta reunião, e estamos contentes em realizá-la tendo na plateia não só avicultores e técnicos, mas também representantes da sociedade civil, como a Associação Comercial e outras autoridades. Isso demonstra o engajamento da comunidade na prevenção, que realmente é vital para o município, já que a avicultura representa a base sócio-econômica de Bastos.”
Outras reuniões semelhantes devem acontecer nas demais regiões produtoras de ovos e frangos em São Paulo, segundo informaram no Seminário em Bastos, já que os riscos são grandes para todos. E o risco maior, no momento, vem dos Estados Unidos, país que já perdeu 38,9 milhões de aves no surto de IA atual. Mais do que o dobro quando comparado ao surto dos anos 1980, até então o maior dos Estados Unidos, segundo dados da revista Globo Rural (site), de 22 de maio.
“O risco de Influenza Aviária no Brasil está desenhado no endemismo dos Estados Unidos, mas o que que pode trazê-la dos Estados Unidos para o Brasil?”, questionou Buchala. E ele mesmo respondeu que estão sendo estudadas todas as variáveis que podem levar à entrada do vírus no Estado de São Paulo. “Vamos estabelecer um bloqueio, com articulação de todas essas variáveis. É o que chamamos de Plano de Prevenção da IA. Não podemos deixar nenhum elo aberto; tudo deve ser dentro de um conjunto de medidas para conseguir o bloqueio. Não adianta fazer essa ação em Bastos e deixar aberto o complexo de Cananéia e Ilha Comprida – área de descanso, no território paulista, de aves migratórias que passam pelos Estados Unidos -, ou nossos aeroportos internacionais. Caso qualquer um desses pontos fiquem desguarnecidos, pode haver o favorecimento da entrada do vírus e provocar uma disseminação muito grande pelo estado.”
Nos Estados Unidos
Quanto ao surto atual nos Estados Unidos, Buchala informou que a situação por lá está endêmica. As primeiras notificações foram em dezembro de 2014, mas nos últimos meses a situação começou a ficar muito preocupante. “Há dois dias – 20 maio - havia 163 focos notificados e 33,8 milhões de aves afetadas O último foco notificado foi no estado de Iowa e um lote de 275 mil poedeiras foram infectados. Lá, os vírus são da prevalência H5N2, mas já há também H5N1 e H7N3 e eles já estão recombinando. Todos os ecossistemas de aves têm sido afetados pela influenza aviária, desde galinha de fundo de quintal até poedeiras, peru, pato, falcão, aves silvestres e aves migratórias. E isso demonstra que a situação é muito grave. O que tem aparecido é só a ponta do iceberg. Certamente isso demonstra que todo o território americano está exposto.”
Ele alertou ainda que em Belize – pequeno país do Caribe – já tem sorologia com vírus de baixa patogenicidade. O México ainda convive com vírus de alta patogenicidade, e na Guatemala já se sabe que há circulação do vírus mexicano. “Se não tomarmos os cuidados necessários e atitudes preventivas firmes, a doença vai descer para o Brasil.”
(Elenita Monteiro é editora da revista A Hora do Ovo. Fotos: Teresa Godoy)
Elenita Monteiro Autor
Jornalista, fundadora e editora da revista A Hora do Ovo.