Coletor de ovos reduz as perdas na avicultura familiar
Desenvolvido pela Embrapa Meio-Norte (PI), o coletor está mudando o perfil da produção de ovos caipiras de cinco municípios do Piauí e um do Maranhão.
Um coletor que protege a produção de ovos de animais predadores - como cobras, cães, o pássaro Cancão (Cyanocorax cyanopogou) e o lagarto teiú (Tupinambis teguixim) - está melhorando os resultados da avicultura familiar no Nordeste brasileiro. Desenvolvido pela Embrapa Meio-Norte (PI), o coletor, que já é conhecido como “piano de galinheiro” devido à semelhança com o instrumento musical, está mudando o perfil da produção de ovos caipiras de cinco municípios do Piauí e de um do Maranhão.
A informação chega da assessoria de imprensa da Embrapa Meio-Norte e traz uma série de detalhes que demonstram a realidade dos produtores de ovos caipiras em outro modo de produção. Segundo o biólogo Marcos Jacob Almeida, “a ideia surgiu da necessidade de se encontrar uma solução para o grande índice de perda de ovos após a postura das aves, que chegava a mais de 50%”. Marcos desenvolveu o projeto juntamente com o bolsista de agronomia Darllan Alves Evangelista. Eles integram a equipe que trabalha na conservação da galinha Canela Preta (Gallus gallus) no projeto liderado pela Embrapa Suínos e Aves (SC).
Com a criação do coletor, informa a Embrapa, hoje praticamente não há perdas. Ele já está sendo usado em 49 municípios do Piauí, Ceará, Maranhão, Bahia e Pernambuco.
O COLETOR
Construído com pinus, madeira usada em reflorestamento, leve, resistente e de baixo custo, o coletor tem 1,06 metro de comprimento; 46 centímetros de largura e 62 de altura. Ele é estruturado com quatro ninhos de 28 centímetros cada, para a postura das galinhas. Cada ninho tem capacidade para armazenar até dez ovos. Esse é um modelo-piloto, adequado para abrigar simultaneamente quatro aves. Dependendo do tamanho do plantel, ele pode ser ampliado e ajustado à necessidade da produção. O preço de um coletor-modelo é R$250,00.
O coletor também está ajudando as aves a terem acesso total à alimentação natural no próprio terreiro. Antes, não era isso que acontecia: para evitar que as galinhas comessem os próprios ovos, o avicultor serrava o bico da ave, procedimento que era feito em larga escala. Com isso, o animal tinha dificuldade de comer fragmentos de grãos e insetos, por exemplo, perdia peso, ficava fraco e facilmente era atacado por doenças. “Esse é outro ponto importante no processo de desenvolvimento da produção de aves caipiras”, garante Almeida.
O primeiro relato de sucesso vem do município de Codó, na região dos Cocais maranhenses. Onias Vieira de Santana, o Baixote, de 66 anos, conseguiu estancar os prejuízos depois que passou a usar o instrumento em seu sítio, no povoado Barra do Saco. “Mais da metade de toda a minha produção de ovos era perdida porque as próprias galinhas a comiam", relata. Hoje, segundo ele, as perdas são mínimas e acontecem quando uma ave está choca e não quer abandonar o ninho. “Com isso, outra galinha que quer pôr não entra no ninho e faz a postura no terreiro, o que facilita a ação dos predadores”, conta.
Com 300 unidades no plantel, todas da raça Canela Preta, Baixote tem uma produção diária de 80 ovos, que são consumidos pela própria família e para a geração de pintos. Além de criar aves caipiras em três galinheiros, todos protegidos com telas de arame, o produtor participa do BioFort, conjunto de projetos da Embrapa com o cultivo de feijão-caupi, batata-doce e milho. A produção vai além dos biofortificados. O sítio, de sete hectares, produz ainda melancia e banana, que são comercializadas na feira do município.
O zootecnista Robério Sobreira, da Embrapa Meio-Norte, que também é especialista em aves, vê a tecnologia como um grande avanço na avicultura familiar do Nordeste. A vantagem principal, segundo ele, é que, após a postura, o ovo rola para um local protegido de predadores e das próprias galinhas, evitando, inclusive, o início do desenvolvimento não planejado de embriões. Ele destaca ainda que o coletor, por ser móvel, possibilita a limpeza e a higienização dos ninhos de forma mais prática e eficiente. Outro ponto importante é que o instrumento tem baixo custo.
COLETOR MELHOROU HIGIENE E ORGANIZAÇÃO
Na comunidade Boca da Vereda, a 48 quilômetros do centro histórico de Oeiras, a primeira capital do Piauí, está um dos melhores exemplos de eficiência do coletor de ovos desenvolvido pela Embrapa. Um plantel de 500 galinhas produz dezenas de ovos diariamente, que são comercializados nos mercadinhos da região a R$0,70 a unidade. “Antes de usarmos o coletor, nossas perdas eram de quase 50%. Aqui, os ataques eram do Teiú, do Cancão e também das próprias galinhas”, diz Valdiléia de Moura Silva, 20 anos, a responsável pela criação (foto no destaque).
Nona filha do casal de agricultores Luis Costa e Cícera Moura, Valdiléia relata que os prejuízos acabaram. “Além de zerar as perdas, o coletor melhorou a higiene e a organização do criatório”. Gerente da propriedade, que tem 80 hectares numa área cercada por 120 famílias, sua meta é ter no mínimo 1000 aves para incrementar a produção de ovos e ampliar a venda para supermercados de grande porte da região.
No povoado Malhada do Juazeiro, a 18 quilômetros do centro do município de Santo Inácio, no sudeste piauiense, o “piano de galinheiro” garante também a boa produção de ovos de galinhas Canela Preta. Gerenciando uma criação de cerca de 200 aves, Francineto de Lima Sousa, professor de matemática da rede municipal de ensino, mudou de vida e começou a ter lucro há oito meses, quando passou a usar o coletor no plantel.
Ele conta que boa parte da produção era consumida por animais, cães, o lagarto Teiú e o pássaro Cancão, este, um predador voraz do sertão nordestino. “Estamos agora mais vigilantes e atentos. O coletor é inovador e resolveu o problema. Normalizamos a produção e estamos avançando no aumento da criação”. A produção média diária de ovos caipiras é de 40 unidades, longe ainda da meta estabelecida pelo criador. Ele quer atingir no mínimo 100 por dia. Parte do produto é comercializada na própria comunidade e a outra fica para a geração de pintos, que são vendidos a R$3,00 a unidade.
Na localidade Serrinha, na entrada de Santo Inácio, alunos da Escola Família Agrícola (EFA) Dom Edilberto estão aprendendo a manejar o coletor. São 80 estudantes que se alternam 15 dias na escola e 15 em casa, repassando aos familiares o que aprendem. A criação de galinha reúne cerca de 150 animais. A produção de ovos ainda é pequena, chegando, em média, a 20 unidades por dia. A escola também está inserida no projeto BioFort, produzindo batata-doce, feijão-caupi e macaxeira com altos teores de ferro e zinco.
AS GALINHAS BRASILEIRAS
As galinhas domésticas criadas no Brasil têm origem no sudeste da Ásia e chegaram por aqui pelas mãos dos primeiros navegadores europeus, ainda em 1500. As aves foram deixadas soltas em fazendas, sítios e nos quintais das casas. Com os cruzamentos aleatórios e a miscigenação das linhagens, surgiu a galinha caipira do Brasil. Conhecidas também como naturalizadas, crioulas, de terreiro e capoeiras, a “galinha brasileira” pode ser de diferentes raças.
É o caso da Canela Preta, também conhecida como galinha jacu. Ela foi localizada pelo biólogo da Embrapa Marcos Jacob Almeida em 2008, no município de Curral Novo do Piauí, no sudeste do estado, a 458 quilômetros de Teresina, na divisa com Pernambuco. São aves mansas e de fácil manejo, com excelente potencial produtivo e reprodutivo. Logo cedo, segundo Almeida, ela solta os pintos e recomeça a postura com boa taxa de eclosão dos ovos.