Metapneumovírus: como devemos combatê-lo?

Metapneumovírus: como devemos combatê-lo?

Como entender o metapneumovírus e as consequências de sua presença na granja de postura? Gleidson Salles, da Zoetis, traça um roteiro neste artigo.

Com a palavra

setembro 19, 2022

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A Metapneumovirose é uma enfermidade de ocorrência relativamente recente no Brasil. Os primeiros casos descritos foram nos anos 1990, mas essa enfermidade vem adquirindo importância crescente na indústria avícola nacional pelos prejuízos que acarreta quando acomete frangos de corte, perus, reprodutoras pesadas e, principalmente, em poedeiras comerciais.

Entre os patógenos respiratórios, o Metapneumovírus aviário (AMPV) é um dos mais relevantes, devido a sua ampla disseminação entre os hospedeiros suscetíveis e potencial de variabilidade genética e antigênica.

Também é conhecida por outras denominações como:

Metapnemovírus Aviário (mPVA).

Rinotraqueíte dos Perus (TRT).

Rinotraqueíte Aviária (ART).

Síndrome da Cabeça Inchada (SHS).

Recentemente foi identificado um vírus isolado em perus nos Estados Unidos de características diferentes dos subtipos A e B e que vem sendo chamado de subtipo C (cepa Colorado), bem como na França há relatos de um isolamento em patos de um subtipo diferente do A, B e C, sendo chamado de subtipo D.

CARACTERIZAÇÃO VIRAL E DISTRIBUIÇÃO DO AMPV

O AMPV possui um genoma de RNA não segmentado e existe uma heterogeneidade significativa nos genes SH, M, N, P e F pode ser usada para diferenciação de subtipos virais (Shin et al., 2002). Mas o mais variável é o gene da glicoproteína de ligação (G) que tem sido usado para a subtipagem do AMPV.

Com base na divergência de sequência de nucleotídeos nos genes da glicoproteína de ligação (G) e suas diferenças antigênicas, os AMPVs foram classificados em 4 subgrupos AMPV-A, AMPV-B, AMPV-C e AMPV-D (Juhasz e Easton, 1994; Eterradossi et ai; 1995; Bayon-Auboyer et al., 1999; Cook e Cavanagh, 2002). O subtipo aMPV-B é o mais difundido em todo o mundo, com exceção da América do Norte (Velayudhan et al., 2005; Andreopoulou et al., 2019; Franzo et al., 2020). Apesar dos esforços dedicados ao seu controle, continua sendo uma das principais ameaças à lucratividade da avicultura.

Abaixo é possível verificar a distribuição dos principais subtipos pelo mundo:

PRIMEIRA-ILUSTRACAO
Fonte: Kaboudi et al; 2021

Em um recente levantamento realizado pela equipe Técnica da Zoetis Brasil, foi possível identificar a importante presença do Metapneumovírus em aves, onde 20% do total de 100 mostras distribuídas pelo Brasil, apresentaram anticorpos para esse agente, as amostras foram coletadas de aves não vacinadas.

SEGUNDA-ILUSTRACAO                                                                                                Fonte: Salles et al; 2022


A transmissão ocorre de forma horizontal por aerossol, através do contato entre aves doentes e aves sadias e essa parece ser a forma mais contagiosa. Outras formas de transmissão são importantes, como água contaminada, equipamentos, caminhões de ração, trânsito de pessoa e fômites. Até hoje não há evidências claras de contaminação vertical da doença, embora tenha sido relatado em formato experimental por Jones em 2002.

Após a infecção das aves, o vírus é excretado por via aérea, porém, normalmente não é eliminado pelas fezes. O vírus pode disseminar-se rapidamente no lote pela sua forma mais importante, que é a via aerossol; as condições de criação, o manejo, as condições de ambiência e a poeira podem influir fortemente na disseminação e na gravidade dos sintomas em aves criadas sobre cama (24 horas), enquanto em aves em gaiola a transmissão é relativamente mais lenta (1 a 2 semanas).

IMAGEM-1 (2)

 
PATOGENIA VIRAL

O vírus entra no organismo pelo trato respiratório, afetando as células ciliadas que revestem as mucosas dos condutos nasais, laringe e traqueia e sua replicação implicará na perda do movimento ciliar, o que posteriormente vai caracterizar os sintomas respiratórios e facilitará a contaminação por agentes secundários. Sua persistência neste local ocorre por volta de 4 a 6 dias após a infecção, podendo persistir por mais tempo e penetrar mais profundamente os tecidos caso ocorra uma contaminação secundária com bactérias patogênicas respiratórias. O vírus se replica no epitélio ciliado do trato reprodutivo (oviduto) através de corrente circulatória após a replicação primária no trato respiratório, podendo ocasionar um bloqueio de algumas funções do oviduto e ovário dessas aves.

Esses danos trazem muitos prejuízos para a avicultura, embora algumas vezes esse agente seja negligenciado ou não tratado com a devida importância que tem.

No gráfico abaixo é possível identificar o período de presença viral em diferentes regiões do sistema respiratório das aves e o período inicial da sintomatologia clínica. Esse é o ponto central na falha da identificação viral no momento de coleta de material para enviar aos laboratórios de diagnóstico. Normalmente coleta-se material de aves com sinais clínicos, porém, na maioria das vezes, não há mais presença viral e acaba ocorrendo um falso negativo nos resultados da PCR, por exemplo.

TERCEIRA-ILUSTRACAO

Fonte: Cook et al; 2001.


Os danos caudados pelo AMPV são severos. Além das mucosas respiratórias, o trato reprodutivo é fortemente atingido, o que acarreta uma má formação reprodutiva e, conse-quentemente, queda de produção e má qualidade dos ovos em poedeiras. Abaixo é possível verificar alguns danos ocasionados pelo Metapneumovírus Aviário.

IMAGEM-2 

Os principais subtipos presentes são o A e B. O AMPV possui apenas um grupo filogenético, mostrando que os subtipos possuem muita similaridade entre si, de aproximadamente 96%.

PREVENÇÃO E CONTROLE

O controle de doenças passa por uma série de medidas que devem ser tomadas de forma conjunta, considerando 3 pilares fundamentais:

Manejo.
Biosseguiridade.
Vacinas e vacinação.

O termo manejo é muito amplo, mas nesse caso devemos olhar para alguns pontos específicos, entre eles, a densidade de aves por galpão, o controle de agentes imunossupressores e bacterianos, o controle ambiental de poeira, fumaça, amônia e, principalmente, a ventilação.

A biosseguiridade pode auxiliar através do isolamento das granjas, eliminação de aves doentes, higienização e desinfecção das instalações de forma correta, lotes alojados com idades únicas na mesma propriedade ou região, controle de fluxo de pessoas e respeitar um vazio sanitário adequado.

A vacinação nesse terceiro pilar assume um papel de protagonismo, pois a imunoprofilaxia irá auxiliar na proteção das aves no plantel. Aqui pode-se fazer uso de vacinas replicantes (vivas) e vacinas inativadas (não replicantes). É importante respeitar a finalidade de cada ferramenta.

Introduzir vacinas nos programas imunoprofiláticos não é uma atividade simples, pois além dos custos envolvidos existe uma enorme limitação na mão-de-obra para aplicar as vacinas. Portanto, quanto mais simples for o programa, melhor será para a execução no dia a dia do campo. Existem dois tipos de vacinas vivas disponíveis no mercado brasileiro, sendo uma do subtipo A e a outra do subtipo B, e as informações disponíveis até o momento indicam que os dois produtos conferem boa proteção cruzada (Worthington, et al. 2003).

Diferentemente de outras doenças, como a Bronquite Infecciosa, por exemplo, os isolados de campo do Metapneumovírus são todos agrupados em um único SOROTIPO. A distinção em diferentes SUBTIPOS não significa que eles não compartilham anticorpos aglutinantes similares. A classificação entre os subtipos está relacionada com variações existentes na proteína G, que é apenas um dos antígenos da superfície do envelope do vírus. Dessa forma, as vacinas feitas com qualquer um dos subtipos têm abrangência sobre os demais. 

COMO ESCOLHER UM BOM PROGRAMA VACINAL?

Vacinas replicantes (Vivas)

As vacinas replicantes acabam estimulando uma resposta celular e humoral, além de causar um bloqueio mecânico do vírus de campo, impedindo sua aderência e colonização no epitélio traqueal. Essas vacinas devem ser atenuadas para não causar reações indesejáveis no animal e imunogênicas o suficiente para estimular as respostas imunes.

Vacinas não replicantes (Inativadas)

As vacinas não replicantes, aqui, induzem maior produção de anticorpos circulantes (IgY) e protegem o trato reprodutivo das aves. Em aves de vida longa o ideal é associar as duas tecnologias, onde a vacina replicante pode colaborar como primer para a vacina não replicante, fornecendo uma proteção mais ampla e uniforme para as aves.

No momento da escolha de um programa vacinal, alguns itens são fundamentais e podem auxiliar na tomada de decisão correta.

Uso de vacinas replicantes

Proteção cruzada contra os subtipos mais prevalentes;

Tipo de criação, idade que se planeja imunizar;

Possibilidade de uso combinado com outras vacinas respiratórias;

Grau de atenuação;

Título infectante do vírus vacinal;

Vias de aplicação (spray, água de bebida, ocular);

Distribuição da estirpe vacinal atenuada;

Equilíbrio entre a imunogenicidade e reatividade.

Uso de vacinas não replicantes:

Escolha da estirpe vacinal;

Tipo de adjuvante utilizado;

Imunogenicidade;

Possiblidade de combinação com outros agentes vacinais.

O controle dessa enfermidade passa por um diagnóstico mais efetivo, incluindo a ca-racterização biológica de isolados virais, análises epidemiológicas mais abrangentes e roti-neiras, biosseguridade, o uso de vacinas mais eficazes e práticas mais efetivas de vacinação. Esse são, certamente, itens críticos na luta contra esse patógeno respiratório.

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GLEIDSON SALLES Autor

Gleidson Sallles é médico veterinário, MSc, doutorando em Biotecnologia. Atua em Serviços Técnicos na Zoetis.

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