Melhoradores naturais de desempenho: extratos herbais na produção animal

Melhoradores naturais de desempenho: extratos herbais na produção animal

A produção animal pode se beneficiar do uso desses agentes de controle, atuando de forma sinérgica com os antimicrobianos químicos ou mesmo substituindo-os.

Com a palavra

junho 18, 2020

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A utilização de plantas com fins medicinais para tratamento, cura e prevenção de doenças, é uma das mais antigas formas de prática medicinal da humanidade (VEIGA Jr. & PINTO, 2005).

Nos últimos anos, aumentou o interesse no estudo de moléculas bioativas em plantas, devido à crescente popularidade dos medicamentos fitoterápicos para humanos e animais.

Partes das plantas, como raiz, caule e folhas, fornecem substâncias bioativas que podem ser empregadas na obtenção de medicamentos. As plantas utilizadas na medicina tradicional também estão sendo cada vez mais estudadas por serem possíveis fontes de substâncias com atividades antimicrobianas frente a microrganismos prejudiciais à saúde (MENDES et al., 2011).

Entre as espécies de plantas conhecidas, 10% contêm Extratos Herbais, sendo denominadas plantas aromáticas (Svoboda & Greenaway, 2003). As propriedades bioativas presentes em Extratos Herbais e Óleos Essenciais, produzidos pelas plantas, como consequência do seu metabolismo secundário, mostraram-se eficientes no controle do crescimento de uma ampla variedade de microrganismos, incluindo fungos filamentosos, leveduras e bactérias, o que evidencia o potencial das plantas no combate a esses organismos patogênicos (DUARTE, 2006).

Os compostos secundários de plantas são usualmente classificados de acordo com a sua rota biossintética. As três famílias de moléculas principais são geralmente consideradas: os compostos fenólicos, terpênicos e os alcaloides. Essas substâncias geralmente não se encontram na planta em estado puro, mas sob a forma de complexos ou traços, cujos diferentes componentes se completam e reforçam sua ação sobre o organismo em questão. Se destacam aproximadamente 3 princípios ativos em grande quantidade em cada espécie de plantas aromáticas (aproximadamente 70%), o restante se apresenta em pequenas quantidades denominados “traços” (aproximadamente 30%).

A combinação entre os princípios ativos ou metabólitos secundários é o que determina a intensidade do impacto total sobre determinada ação. Isso leva à conclusão de que esses metabólitos isolados (ou mesmo sintetizados) não terão o mesmo impacto quando comparados a uma mistura de componentes atuando de maneira sinérgica. Acredita-se que, mesmo uma substância em concentrações muito baixas, tenha uma função significativa e essencial para determinado fim.

Os Extratos Herbais e seus metabólitos secundários combinados entre si, ou até mesmo com antimicrobianos químicos, podem atuar como adjuvantes, modificando a resistência bacteriana frente a determinadas drogas, diminuindo a dose necessária de antimicrobiano para um resultado eficaz (Simões et al., 2009).

Os Extratos Herbais podem ser obtidos por meio de diferentes processos, sendo que os mais utilizados são a maceração, infusão, percolação, digestão (planta e solvente), destilação e secagem (MARTINS et al., 2000). Segundo OETTING (2005), a principal diferença entre os Extratos Herbais e os Óleos Essenciais é o método de extração. Os óleos essenciais, apesar de não deixarem de ser considerados Extratos Herbais, são obtidos somente pelo método de extração a vapor.

Os princípios ativos dos vegetais são moléculas de baixo peso molecular, e como já comentado, oriundas do metabolismo secundário dos vegetais. Esses compostos são produzidos como um mecanismo de defesa da planta contra fatores externos, tais como estresse fisiológico (falta de água ou nutriente, por exemplo), fatores ambientais, proteção contra predadores e patógenos, e na atração de organismos benéficos e polinizadores (Figura 1.)

É por esse motivo que a composição dos constituintes metabólicos de uma planta pode variar de acordo com o clima, solo, chuvas, estação do ano, período de colheita, cultivo, parte da planta utilizada e fase de desenvolvimento em que foi colhida (COSENTINO et al., 1999; MARINO; BERSANI; COMI, 1999). Outra fonte de variação que deve ser levada em consideração é o método de extração/destilação e estabilização utilizado, e o tempo e condições de armazenamento (HUYGHEBAERT, 2003). 

Figura 1. Fatores que interferem diretamente na qualidade dos Extratos Herbais

FIGURA-1_OK

O uso de Extratos Herbais como promotores de crescimento em animais ainda é um assunto recente, porém, o número de pesquisas está aumentando gradativamente devido a diversos fatores, um dos mais comentados é o aparecimento de cepas bacterianas multirresistentes (FASCINA, 2011). 

Muito se discute sobre a atribuição do uso dos aditivos promotores de crescimento na pressão seletiva dos genes de resistência aos antimicrobianos que afetam a terapia antibiótica humana. Consequentemente, o uso desses antimicrobianos químicos em alimentos para animais está sendo reduzido, ou, em alguns países, banido completamente (BEDFORD, 2000).

Com relação à nomenclatura, frequentemente os profissionais da área animal deparam-se com dúvidas acerca do emprego correto de termos farmacológicos. Dentre esses, está a utilização das palavras fitoterápicos ou fitogênicos que, de acordo com a Resolução da Diretoria Colegiada número 48 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (BRASIL, 2004), são termos distintos e que devem ser utilizados de maneira correta na nutrição animal.

A terminologia fitoterápica designa os medicamentos que utilizam exclusivamente matérias-primas vegetais ativas e que, assim como todo medicamento, deve existir a caracterização da sua eficácia e risco de seu uso por meio de estudos etnofarmacológicos, além de permitir a reprodutibilidade e controle de qualidade (BRASIL, 2004).

Enquanto que fitogênicos são produtos compostos de Óleos essenciais e/ou Extratos Herbais utilizados nas rações animais para serem utilizados na melhoria do desempenho animal, sem efeito medicamentoso, quer seja pelo princípio ativo ou dose utilizada (FASCINA, 2011).

MECANISMOS DE AÇÃO

Nostro el al., 2004 cita que os Extratos Herbais atuam dispersando as cadeias de polipeptídios que irão constituir a matriz da membrana celular. Atuam provocando mudanças na permeabilidade e atividade da membrana celular das bactérias; alterações na atividade dos canais de cálcio, perturbação do equilíbrio iônico e perda de íons. Esses danos ao sistema enzimático das bactérias estão relacionados à produção de energia e síntese de componentes estruturais, dificultando a condução e transporte do ATP intracelular.

Na Figura 2 é possível observar algumas características antimicrobianas da ação dos Extratos Herbais.

Figura 2. Ação sobre a parede celular bacteriana
FIGURA-2
Segundo Kohlert et al. (2000), os princípios ativos dos Extratos Herbais são absorvidos no intestino pelos enterócitos e metabolizados rapidamente no organismo animal. Os produtos deste metabolismo são transformados em compostos polares, através da conjugação com o glicuronato e excretados na urina. Outros princípios ainda podem ser eliminados pela respiração como CO2. A rápida metabolização e a curta meia vida dos compostos ativos levam a crer que existe um risco mínimo de acúmulo nos tecidos (Kohlert et al., 2000).

BURT (2004) confirma que Extratos Herbais e Óleos Essenciais são ligeiramente mais ativos contra bactérias Gram positivas do que contra as bactérias Gram negativas, pois os organismos Gram negativos possuem a membrana externa que envolve a parede celular, o que limita a difusão dos compostos hidrofóbicos através da sua camada de lipopolissacarídeos.

Figura 3. Parede celular de bactérias Gram positivas e Gram negativas
FIGURA-3


PROPRIEDADES 
ANTIMICROBIANAS DO LÚPULO

Atualmente o lúpulo é uma planta estudada na produção animal (Figura 4). Os constituintes das substâncias amargas do lúpulo (Humulus lupulus) possuem uma potente atividade antimicrobiana contra uma variedade de microrganismos (GERHAUSER, 2005; SRINIVASAN et al., 2004; LEWIS et al., 1994). Aplicações antimicrobianas de lúpulo incluem atividade antiprotozoária, anticlostridial e atividades antivirais, além de várias aplicações em alimentos sob a forma de aditivos para a ração animal e uso como fonte potencial de novos antibióticos (CORNELISON et al., 2006; MITSCH et al., 2004; LEWIS K., AUSUBEL F.M., 2006). Espécies bacterianas com susceptibilidade relatada ao lúpulo incluem Clostridium perfringens, Clostridium difficile, Clostridium botulinum, Mycobacterium tuberculosis, e cepas resistentes a antibióticos de Staphylococcus aureus e Helicobacter pylori (SRINIVASAN et al., 2004). 

Figura 4. Planta do Lúpulo

FIGURA-4

As substâncias do lúpulo são classificadas em dois grupos: αácidos e βácidos (Figura 5), sendo que outros compostos também estão presentes de forma natural ou então formados durante a secagem e armazenamento da planta (BIENDL M., PINZL C., 2008). Os αácidos (humulonas) e seus isômeros solúveis em água e os isoαácidos (isohumulonas) são os principais componentes que conferem o sabor amargo deste vegetal. Essas substâncias atuam como ionóforos na parede celular bacteriana Gram positiva, causando alteração do potencial transmembrana, resultando no vazamento de ATP e morte celular (TEUBER M., SCHMALRECK A.F., 1973; SCHMALRECK A.F., TEUBER M., 1975).

As atividades antimicrobianas dos βácidos são atribuídas a uma série de compostos similares, como a lupulona e seus congêneres (adupulona, colupulona, entre outros). Esta classe contribui menos para o amargor do que a classe dos αácidos, porém possuem maior atividade antimicrobiana devido à sua natureza hidrofóbica (SIRAGUSA et al., 2008). Seu efeito antimicrobiano ocorre na estrutura da parede celular bacteriana, desnaturando e coagulando proteínas.

Atua também alterando a permeabilidade da membrana citoplasmática para íons de hidrogênio e potássio, causando a interrupção dos processos vitais da célula, como transporte de elétrons, translocação de proteínas, fosforilação e outras reações que dependem de enzimas, o que resulta em perda do controle quimiosmótico da célula, levando a morte bacteriana (DORMAN et al., 2000).

A lupulona, por ser um potente agente anti clostridial, demonstra que os β-ácidos do extrato de lúpulo reduzem ou inibem a proliferação de Clostridium perfringens a nível intestinal, tornando-se uma alternativa natural, viável, confiável e economicamente sustentável para a produção avícola mundial.

Figura 5. Fórmula química dos αácidos e βácidosFIGURA-5

De acordo com Rahman e Kang (2009), o risco de que microrganismos patogênicos venham a desenvolver resistência aos Óleos Essenciais e Extratos Herbais é muito baixo, uma vez que estes produtos contêm uma mistura de substâncias antimicrobianas, que atuam através de diversos mecanismos.

A partir dos conceitos apresentados acima, consideramos que a produção animal, especialmente de aves e suínos, pode beneficiar-se do uso dessas ferramentas de controle de enteropatógenos, que vão além do uso dos produtos comumente utilizados no mercado, atuando de forma sinérgica com os antimicrobianos químicos ou em substituição aos mesmos. 

(REFERÊNCIAS)
DUARTE, M.C.T. Atividade Antimicrobiana de Plantas medicinais e aromáticas utilizadas no Brasil. Construindo a história dos Produtos Naturais. Vol. 7. Multi Ciência: Revista Interdisciplinar dos Centros e Núcleos da Unicamp. 2006.
DORMAN, H. J. D.; DEANS, S. G. Antimicrobial agents from plants: antibacterial activity of plant volatile oils. Journal of Applied Microbiology. Vol. 88. Oxford. 2000.
MENDES, J. M. Investigação da atividade antifúngica de óleo essencial de Eugenia coryophyllata Thunb. Sobre cepas de Candida tropicalis. João Pessoa, PB. Universidade Federal da Paraíba. 2011.
KOHLERT, C., et al. Bioavailability and pharmokinetics of natural volatile terpenes in animal and humans. Vol. 66. Planta Medica. 2000.
FASCINA, V. B. Aditivos fitogênicos e ácidos orgânicos em dietas defrangos de corte. Botucatu, SP.  Universidade Estadual Paulista. 2011.
VEIGA JR, V.F.; PINTO, A.C.; MACIEL, M.A.M. Plantas medicinais: cura segura? Vol. 28. Quimica Nova. 2005.
MARTINS, E. R.; CASTRO, D. M.; CASTELLANI, D.C.; DIAS, J. E. Plantas Medicinais. Viçosa, MG. UFV. 2000.
OETTING, L. L. Extratos vegetais como promotores de crescimento de leitões recém-desmamados. Piracicaba, SP. Escola Superior de Agricultura, Universidade de São Paulo. 2005.
BURT, S. Essential oils: their antibacterial properties and potential applications in foods--a review. Vol. 94. Torino. International Journal of Food Microbiology. 2004.
NOSTRO, A., et al. Susceptibility of methicilin-resistant Staphylococci to oregano essential oil, carvacrol, and thymol. Vol. 230. FEMS Microbiology Letters. 2004.
GONZÁLEZ-LAMOTHE, R., et al. Plant antimicrobial agents and their effects on plant and human pathogens. Vol. 10. International Journal of Molecular Sciences. 2009.
SIMÕES, M.; BENNETT, RN.; ROSA, EAS. Understanding antimicrobial activities of phytochemicals against multidrug resistant bacteria and biofilms. Vol. 26. Natural Products Report. 2009.
COSENTINO, S.; TUBEROSO, C. I. G.; PISANO, B.; SATTA, M.; MASCIA, V.; ARZEDI, E.; PALMAS, F. In vitro antimicrobial activity and chemical composition of Sardinian Thymus essential oils. Vol. 29. Oxford. Letters in Applied Microbiology. 1999.
MARINO, M.; BERSANI, C.; COMI, G. Antimicrobial activity of the essential oils of Thymus vulgaris L. measured using a bioimpedometric method. Vol. 62. Des Moines. Journal Food Protection. 1999.
HUYGHEBAERT, G. Replacement of antibiotics in poultry. Quebec. EASTERN NUTRITION CONFERENCE. Anais... Quebec City: UON. 2003.
SAÚDE, Ministério da. Resolução RDC n48, de 16 de março de 2004. Disponível em: http://e-legis.bvs.br/leisref/public/showAct.php?id=10230. 2004.
RAHMAN, A.; KANG, S. Inhibition of foodborne pathogens and spoiling bacteria by essential oil and extracts of Erigeron ramosus (walt.) b.s.p. Vol. 29. Journal of Food Safety. 2009.
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FABRÍZIO MATTÉ Autor

Consultor técnico da Vetanco Brasil

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