Chacrinha tinha razão, é a hora do ovo

Chacrinha tinha razão, é a hora do ovo

Uma crônica deliciosa e bem humorada da mineiríssima Dra. Marília Martha Ferreira sobre nosso mundo do ovo.

Com a palavra

julho 12, 2012

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Dra. Marília Martha Ferreira

“Quem não se comunica se trumbica”. Este era o lema do grande comunicador do século XX, que fez carreira e história nas mídias da época. E por que esta lembrança do Velho Guerreiro? Porque falta comunicação desse produto animal dos mais nobres que existem na natureza: “o companheiro ovo”.

Por que, companheiro? Nada de política, e sim porque ele está sempre ao nosso lado, na nossa alimentação, no bolo, na torta, no sorvete, no sanduíche, na salada e na famosa gemada. É isso mesmo, trabalho há quase 50 anos na atividade avícola e só agora o ovo está sendo tratado por profissionais da publicidade. É a hora do ovo.

Até bem pouco tempo, os reclames, como minha avó dizia, eram feitos por voluntários, amadores, pessoas que apenas conheciam o rico conteúdo desta cápsula de cores branca e tons pastéis. Então surgiam ideias bastante surreais, como a que eu tive: no ano de 1983, o mineiro João da Mata de Ataíde, correndo pelo Clube Atlético Mineiro (“Galo”), ganhou a tradicional Corrida de São Silvestre e ficou muito famoso; fui, com um funcionário de uma empresa de produção de ovos, atrás do atleta para tentar convencê-lo a correr com uma camiseta ostentando um logotipo ou a frase “Coma ovos”. João, soldado da nossa gloriosa Polícia Militar, nascido em Diamantina, conterrâneo de JK, em sua simplicidade, não titubeou, adorou a ideia.

Mas nós, amadores por excelência, sem o apoio dos produtores, nem pensamos em patrocínio, tutu, carvão, contratos; e sim em mandar fazer meia dúzia de camisetas azuis, com a frase na cor branca (ideia do João) e ele sairia correndo por aí.  O prêmio seria uma caixa de 30 dúzias de ovos. No nosso amadorismo, não tínhamos noção do tamanho da camiseta e a mesma ficou tipo camisolão, pois o atleta era um varapau magérrimo, biotipo comum aos corredores de longa distância. Só tínhamos aquele orçamento, e ele voltou para o quartel. Não devolveu as camisetas nem vestiu.  Esperamos que, pelo menos, ele tenha consumido os ovos, o que já foi um grande sucesso.

Outros pensamentos esdrúxulos e solitários nos acometeram no correr destes anos: campanhas para inclusão de ovos na merenda escolar, aproveitamento de cascas de ovos torradas como suplemento alimentar em creches e asilos – trabalho que a Prefeitura de BH fez com excelentes resultados, mas também não vingou.

Dr. Haroldo Vasconcelos, o paladino do consumo de ovos sem restrição, o saudoso mestre, médico pediatra que reconhecia no ovo o poder de combater a desnutrição infantil, chegou a escrever para a Rainha dos Baixinhos, elencando com a maior sabedoria científica os benefícios do ovo para combater a fome entre as crianças. Alguém respondeu? Que eu saiba, até hoje não.

E assim se passaram mais décadas e as notícias sobre os ovos eram sempre negativas, como maioneses estragadas, cheias de salmonela, que levavam ao hospital turmas escolares ou participantes de festas; e o colesterol, que seria o mal do século para aqueles que comessem mais de um ovo por semana. A notícia mais curiosa da época, que ouriçou jornalistas, nos idos de 2004, foi quando uma galinha, com peso de 1 quilo e 700 gramas, botou um ovo de 180 gramas. Pode? Logo virou celebridade com o apelido de “coitadinha”. Jornais, rádios e televisão foram fotografá-la e ao seu rebento; mestres foram convocados para explicar se haveria sequelas pós-parto, que aliás foi natural; mas o ovo ficou para “titio”, pois a proprietária da galinha não deixou que o quebrassem para pesquisa nem para omelete. Ela disse aos repórteres e profissionais de veterinária: “Se quebrar o ovo, meu marido larga de mim”. Assim acabou a história.

Não se pode perder mais tempo, é necessário maior atenção dos produtores de ovos para a publicidade moderna e o fortalecimento das associações que assim terão mais condições de fazer a defesa do segmento.  O aval do dono do tesouro é fundamental para fazer o produto alavancar, com o necessário apoio e combustível. Caso os donos das galinhas continuem pensando como nos tempos passados, o povão continuará achando que comer ovo é coisa de pobre, e os supermercados jamais colocarão uma bela gôndola para oferecer o precioso alimento aos consumidores. É isso aí, gente, vamos evoluir, participar com assiduidade das reuniões e eventos que sempre aumentam a visibilidade e a importância do “companheiro ovo”. 

Marília Martha Ferreira é médica veterinária das boas em Minas Gerais. É também parceira da avicultura mineira, sendo diretora executiva da Avimig, a Associação da Avicultura de Minas Gerais. 

Marília Martha Ferreira Autor

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